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Presentações de livros

Os Grandes Casos de Psicose
Sob a égida de J.D. Nasio

Os Grandes Casos de Psicose
248 págs.,R$ 29,00
J.-D. Nasio (org.). Trad. Vera Ribeiro. Ed. Jorge Zahar (r. México, 31, sobreloja, CEP 20031-144, RJ, tel. 0/xx/21/240-0226).

A terapia e sua novela

"Os Grandes Casos de Psicose" mostra como Freud, Lacan e Winnicott trataram pacientes que se tornariam emblemáticos para a psicanálise

Marcelo Coelho
colunista da Folha (São Paulo, domingo, 29 de abril de 2001)

Aos oito anos, Léon não conseguia ficar de pé. Quando se sentava numa cadeira, caía para a frente, esparramando-se sobre a mesa. Tocava piano com muita habilidade, desde que prendessem seu corpo ao espaldar da cadeira. Não tinha nenhum problema neurológico. Depois de algumas sessões de psicanálise, pôs-se a andar normalmente; logo conseguiu correr, pular numa perna só e jogar bola.
Joey tinha nove anos e meio. Parecia ser acionado por um controle remoto; agitava-se como uma máquina. Seus gestos iam se acelerando cada vez mais, até que ele "estourava", perdia a energia, ficava "desligado". Demorou dois anos para que, sob os cuidados de um analista, pudesse se ligar afetivamente às outras pessoas.
Outro capítulo conta a história de Dick, um menino de sete anos. Ele "tinha tudo de um extraterrestre (...), ficava ausente para as pessoas e objetos que o cercavam (...), emitia sons repetitivos, sem significação". Parecia se interessar apenas por duas coisas: trens e maçanetas. Após dois anos de análise, "havia fincado pé na realidade. Falava. Estabeleceu relações afetivas com a mãe e o pai".
Esta resenha vai começando com um tom bastante sensacionalista, como se estivéssemos falando dos milagres de alguma igreja pentecostal. Para um leigo em psicanálise, entretanto, é difícil não destacar o que esses casos clínicos têm de espantoso, de bizarro, e o quanto parecem mágicas as soluções que cada terapeuta conseguiu encontrar.

Perseguido por Deus Talvez estejam aí o problema e o fascínio deste livro. Organizado pelo psicanalista J.-D. Nasio, compõe-se de capítulos escritos por vários especialistas, cada um deles resumindo um grande caso de um grande psicanalista. Vemos como Freud (1856-1939) interpretou as memórias de Schreber, que se julgava perseguido por Deus, dando centenas de urros por dia, para provar que ainda não fora destruído por seu inimigo.
Faz-se uma síntese da interpretação de Lacan (1901-1981) a respeito da história das irmãs Papin -empregadas exemplares que, de surpresa, assassinaram a facadas a patroa e a filha desta, arrancando-lhes os olhos antes de matá-las.

Conta-se como Melanie Klein tratou do menino Dick -o dos trens e maçanetas- e Winnicott, da "pequena Piggle". Essa menina de dois anos e meio se via ameaçada por uma "outra mãe" imaginária, que morava dentro de sua barriga. Outros capítulos narram de que modo Bruno Bettelheim cuidou de Joey, o garoto que se comportava como uma máquina, e como Françoise Dolto curou Léon, o "menino sem costas", e tratou do adolescente Dominique, "de caráter impassível", "incapaz de se orientar no tempo e no espaço", padecendo de um pavor extremo diante de bicicletas e carrosséis. Transtornos mentais tão estranhos convidam ao sensacionalismo, e o engenho, a intuição, o método interpretativo de cada analista são admiráveis. Esse é o lado mais fascinante do livro e o que o torna imediatamente acessível ao leitor leigo.
Ao mesmo tempo, todavia, os diversos colaboradores deste volume se preocupam em resumir as implicações desses casos para a teoria psicanalítica. Não se conta apenas a história sensacional de Dick, mas como Melanie Klein partiu desse caso para desenvolver suas concepções a respeito da importância do sadismo na constituição da realidade pelo sujeito.
Os casos tratados por Dolto ilustram seus conceitos de "imagem do corpo" e de "castrações simboligênicas". O organizador do livro, J.-D. Nasio, tem um caso seu resumido por Anne Lefèvre, onde se discute o conceito de "foraclusão localizada".
Não que essas discussões teóricas sejam totalmente herméticas. Os autores dos ensaios preocupam-se em apresentá-las com clareza. É o "registro" do livro que parece oscilar, contudo, entre o tom de divulgação e o aprofundamento técnico; entre a sofisticação conceitual e a intriga novelesca.
Longe de constituir um defeito, essa característica parece de qualquer modo ser constitutiva da literatura psicanalítica desde Freud. Pode ser só impressão minha, mas sempre me parece existir uma espécie de hiato entre o caso narrado e a sua solução; entre a complexidade da psicose e a relativa facilidade da cura.
Por vezes, no livro, a figura do analista é claramente mitificada. O garoto Dick entra no consultório. Os autores do capítulo, Tristan Garcia-Fons e Marie-Claude Veney-Perez, descrevem a cena. "Lá está a senhora a observá-lo. Ele sente isso, confusamente. É uma mulher alta, de cabelos grisalhos e olhos claros. Uma força estranha, quase ameaçadora, emana dela, mas há também uma meiguice acolhedora." Trata-se de Melanie Klein.

O "bebê-Winnicott" A partir daí, tudo fica fácil. De um lado, porque as iniciativas desses grandes psicanalistas, os expedientes inovadores a que recorrem para estabelecer contato com seus pacientes, são realmente geniais. Para tratar da menina de dois anos e meio, Winnicott (1896-1971) finge chorar, esperneia, apresenta-se como o "bebê-Winnicott" para sua pequena paciente. Há tanta intuição e "psicologia", no sentido mais banal do termo, quanto saber psicanalítico em intervenções desse tipo.
Por outro lado, os sucessos espetaculares que o livro descreve e as generalizações teóricas que parecem ser tiradas a partir de cada caso particular não deixam de ter um componente literário, uma dose de elaboração retórica, um quase audível fundo musical de filme de suspense com final feliz.
Podemos apreciar esteticamente a narração dessas aventuras analíticas ou persuadir-nos racionalmente de sua eficácia terapêutica; talvez seja possível ter as duas atitudes ao mesmo tempo. Neste livro, em todo caso, os dois registros se alternam com excessiva rapidez.

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