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2001 - A ODISSÉIA LACANIANA
Colóquio Internacional: Lacan no século

Breves crónicas das atividades
Sexta, 13/04/2001

Aline de Alvarenga Coelho

Colóquio: Amor e Servidão

Coordenação: José Monsegny e Sonia Borges

Dóris Rinaldi - A subjetividade hoje: os paradoxos da servidão voluntária.
Dóris evoca os significantes de fundação e filiação que podemos encontrar nestas comemorações: 100 anos do nascimento de Lacan; cem anos de Interpretação dos Sonhos, comemorado no último ano e, por fim, os 500 anos do descobrimento do Brasil, também comemorados no ano passado. Ela retoma um texto de 1550 de Lavoisier. Neste texto, o autor fala da servidão voluntária. Haveria uma passagem da liberdade a servidão. Desejo de servidão X desejo de liberdade que mostra a divisão do sujeito. Servidão pela sedução de um nome: o nome de Um. A tirania se engendra ao desejo de servir. O Um do traço unário (identificação ao traço de um objeto) se opõe ao um do ideal do eu (função unificadora). O primeiro é o traço distinto da pura diferença. A grande questão deste autor e de Dóris era: como um homem comum pode ser elevado a posição de Um? O Um da servidão voluntária é aquele que ocupa um lugar de encantamento imaginário. A divisão do sujeito é apagada. No mundo moderno, nós estamos inseridos no discurso capitalista e o da ciência. A servidão voluntária exige um tirano e o desejo de servidão segue o desejo de identificar-se com o tirano. A partir daí, Dóris pensa no caso brasileiro, baseando-se no livro Hello, Brasil, de Contardo Calligaris. Segundo Calligaris, vemos no Brasil um problema de "untegração", ou seja, ausência de Um. Há uma pluralidade brasileira. O Um do Brasil estaria no estrangeiro, o que nos remete a nossa posição de colonizados. No momento, percebemos em especial a invasão norte-americana.

Maria Antonieta Izaguirre - El valor de la vida: violencia y miedo en la vida cotidiana.
Ela começa assegurando que o Nome-do-Pai extrai a lei da morte. Freud interessou-se pela agressividade e pulsão de morte. Lacan também realizou estudos sobre a agressividade. Ela relata a situação de seu país (Venezuela). O direito a vida é uma idéia contemporânea a de Estado. Estado seria aquele que garantiria o direito a vida, mas isso não acontece em nosso mundo, onde esse mesmo Estado faz uso da violência explícita. Acontece aí uma falha da operação paterna na ordem simbólica. A violência faz com que percebamos o mundo como algo perigoso e dá uma sensação de luto aos sobreviventes. A violência aparece como relato na clínica. Há uma desgraça que não pode ser representada, não pode ser posta em números. É uma falta de sentido.

Vera Pollo - O discurso analítico e as formas do amor. Ela retifica o título, dizendo que deveria ser "O discurso analítico e as coisas do amor". O discurso analítico não se situa na reivindicação de direitos. O amor (transferência) pode ser terapêutico, mas também pode causar um curto-circuito no processo analítico. Lacan assinala que o discurso analítico não traz felicidade, mas traz algo novo. Freud quis saber o que querem as mulheres; por isso, deparou-se com as histéricas. Signo do amor X gozo do Grande Outro. O discurso analítico deve acolher o que o discurso capitalista foraclui: as coisas do amor.

Jorge Zanghellini - El Otro del amor. As razões do amor, do enamoramento, são inesgotáveis. Amor não é trivial, nem é sublime. Não há proporção sexual, não há como fazer Um. O amor deve ser a enunciação de dois. Um é o enfraquecimento da alteridade. Mais-de-gozar - efeito da castração. O gozo feminino é referido à função fálica e não-todo referido à função fálica. A função feminina é de errância. A mulher tenta fazer do amor uma estabilização de sua relação com o mundo. O homem separa o mundo do amor. Ele toma parte por parte. O amor permite suportar a alteridade. --

Simpósio Psicanálise e Sociedade: Psicanálise e Neurociência

Coordenação: Angela Mucida

Bernard Nominé - Ele começa falando do isolamento dos neurotransmissores. A partir daí, descobriu-se os efeitos dos neurolépticos. A promessa da psicofarmacologia é de que a psicose deixaria de ser um diagnóstico sem apelação. Essa promessa não se cumpriu. A psicanálise passou a querer banir todas as influências das neurociências; estas, por sua vez, não negam a existência do inconsciente. No Projeto, Freud se antecipa à neurologia uns 50 anos, pois antecipa a descoberta da sinapse. O interesse de Freud era sustentar suas hipóteses em comprovações biológicas. Lacan substitui a lógica do equilíbrio energético pela lógica da gramática. Os dois nunca mantiveram relações pouco amistosas com as ciências conexas. Nem consideram inteligente esta posição. Se a psicanálise não tentar se apropriar destes saberes (como Freud e Lacan o fizeram), outros saberes (nossos opositores, como os cognitivistas) irão se apropriar. O uso das neurociências é bastante apropriado ao pensamento americano e a indústria farmacológica. A culpa não é das neurociências, mes de seu desvio para atender a interesses das indústrias farmacêuticas. Nominé cita uma pesquisa sobre o autismo em que se conclui que este paciente percebe o rosto como se fosse um objeto inanimado; daí sua impossibilidade de se relacionar apropriadamente com o mundo. Nominé não critica a pesquisa, mas seu caráter conclusivo. Afinal, foi justamente aquilo que escapou a Charcot, que Freud pôde acolher. A psicanálise deve acolher exatamente aquilo que escapa a qualquer conclusão.

Sonia Alberti - Crítica a uma teoria organodinâmica das neurociências. Quando Freud fala em aparelho psíquico armazenando energia e fazendo novos trilhamentos (1895), ele não está mais falando em neurônio, e sim em estruturação psíquica. Freud materializa o inconsciente. A psicanálise é materialista. O problema das pesquisas em neurociências é que elas são extemporâneas, ou seja, os resultados são logo teorizados e postos em prática sem quaisquer questionamentos. Tudo é "feito às pressas", parodiando Schreber. As neurociências acreditam que vão resolver todos os problemas psíquicos. O problema é que elas confundem software com hardware. Elas acham que, resolvendo problemas no hardware, se resolve no software, o que, efetivamente, não acontece.

Gabriel Lombardi - O ponto de partida freudiano foi distinguir um sintoma neurológico de um sintoma histérico. Ele extrai da neurologia o nervo de um discurso novo. Seu Projeto foi um projeto abortado. Lacan estabelece uma ruptura entre psicanálise e ciência, mas afirma que o sujeito da psicanálise não é outro senão o sujeito da ciência. A psicanálise se separa, mas não se aliena da ciência. São coisas diferentes. Quem se separa não desconhece aquilo de que se separou. Os novos cientistas tentam eliminar um dualismo que não pode ser eliminado depois de Descartes. Todas as neurociências são pseudo-ciências que servem como legitimação para os saberes que competem com a psicanálise. A única destas ciências que tem aplicação é a psicofarmacologia. O uso de medicamentos não deve ser pura e simplesmente combatido pelo psicanalista, no sentido de que este pode facilitar seu trabalho. Um psicanalista não pode desconhecer os efeitos da ciência, sejam eles positivos ou negativos.

Carmen Gallano - Freud não quis publicar o Projeto porque na Carta 52 (1896), ele já propõe uma outra forma de pensar o aparelho psíquico. Nesta carta, Freud começa a formular uma nova ciência. Porém, é apenas através de sua própria experiência clínica que Freud pôde articular sua teoria. Lacan não tinha os ideais cientificistas de Freud. A clínica do sujeito apresenta um obstáculo para as ciências, pois esta o foraclui. As neurociências não cessam de decretar a morte da psicanálise e a psicologia e a psiquiatria estão sendo engolidas por estes saberes, pela ciência e o discurso do capitalista. Só a psicanálise lhe opõe resistência. -- (Ver reseña mas extensa de esta exposição)

Simpósio Psicanálise e Sociedade: Novas Formas da Sexualidade e da Família.

Coordenação: Angélia Teixeira

Marc Strauss - O século XX é o século de Lacan. O discurso capitalista faz de todos nós proletários, na busca do mais-de-gozar. As famílias se desfazem no sentido do desfazimento do casal homem e mulher. Strauss cita uma síndrome contemporânea: crianças e adolescentes tiranos, que agridem os pais, inclusive fisicamente. Qual será o lugar para a psicanálise nesse mundo? A psicanálise quer saber onde se aparelha o gozo para cada um. O gozo está sempre em excesso e é o único trauma. O gozo fálico é fora do corpo, mas não está fora do significante, nem da linguagem. O único casamento que existe é o do sujeito com o gozo. Aí, ele apela ao Nome-do-Pai para lhe dar uma significação fálica. O Édipo é uma criação dos neuróticos. A psicanálise não deve se submeter a ele. O Nome-do-Pai é um modelo que não é ideal. Pai é aquele que faz de uma mulher o objeto de seu desejo. O desejo de um homem não deve ser anônimo para uma mulher. Teríamos nós uma nostalgia do século freudiano? Strauss relata alguns casos comuns atualmente: pais acusados de bolinar os filhos e longos processos de divórcio nas classes mais abastadas.

Luís Izcovitch - Ele afirma que o contexto dos anos 70 é bem diferente do nosso. O que antes era analisado, hoje é julgado. A suspeita é generalizada. A justiça vive às voltas com acusações de atos sexuais. Temos o discurso de um capitalismo exacerbado de mãos dadas com a ciência. Discurso feminino no final dos anos 60: "Filhos se e quando eu quiser." Filhos quando eu quiser significa filhos apenas após a realização profissional. Isso indica que a mulher está entrando no mercado de trabalho competindo com o homem em pé de igualdade. Dez anos mais tarde, a mulher exige da ciência o direito de ter filhos. São os métodos da inseminação artificial. A clonagem, por sua vez, traz consigo a idéia de seleção intelectual. O discurso "a criança que me devem" é o da idealização dessa criança, perfeita, sem nenhum problema de funcionamento. Se a ultrassonografia revela alguma coisa, os pais logo optam pelo aborto. Filho se torna um objeto de consumo que deve ser perfeito, dentro da lógica do discurso capitalista. A clonagem, além disso, é uma técnica que exclui a reprodução sexual e, mais do que isso, exclui a diferença sexual, pois só podem ser reproduzidas mulheres. Não há necessidade de espermatozóide, mas precisa-se do óvulo. Eliminar a diferença sexual é eliminar o inconsciente na reprodução. Isso está de acordo, mais uma vez, com o discurso capitalista, em que a castração é foracluída - eliminação das diferenças. O discurso do analista seria uma saída para o discurso capitalista, pois o gozo coletivo é substituído pelo gozo singular.

Alba Abreu Lima - Ela nos fala do declínio social da imago paterna e os novos enfoques para a sexualidade. Atualmente, a união estável entre um homem e uma mulher, mesmo fora do casamento, é regularizada. Ela lembra da interdição do incesto, que é o que regula as relações familiares. A metáfora paterna, por sua vez, não é dada; ela precisa ser posta em ação. Nos casos de divórcio, a criança tenta tornar possível a relação sexual (juntar "papai e mamãe). As relações modernas são narcísicas, pois o parceiro é tomado apenas como objeto de gozo. No caso masculino, porém, os casos de impotência mostram que seu desejo não é tão simples como pode parecer à princípio.

Rodrigo Pereira - Ele é advogado e fez uma das melhores apresentações do evento, deixando a platéia bastante interessada. O direito é uma sofisticada técnica para domesticar as pulsões. Freud introduz um novo discurso sobre a sexualidade, colocando-a na ordem do desejo. Qual seria o limite de intervenção do Estado na vida das pessoas? Na objetividade jurídica permeia uma subjetividade. A igualdade de direitos entre homem e mulher coloca que, legalmente, a mulher não está submetida ao homem. Também não existem mais filhos ilegítimos. Rodrigo faz um comentário bastante belo, afirmando que todo filho é adotivo, pois é preciso que o pai adote aquele filho como seu, que o reconheça enquanto tal. Em 1988, a constituição brasileira inclui novas formas de família reconhecidas legalmente. Família é uma estruturação psíquica em que cada um ocupa uma posição. Quase tudo o que se discute no direito de famíla diz respeito à sexualidade. Nos casos de separação, como havia afirmado Marc Strauss, parece haver um litígio interminável, que é a forma encontrada pelo casal para não se separar. Ele lembra que, no poder judiciário, trata-se de demandas. E não se pode esquecer, juntamente com Lacan, que toda demanda é demanda de amor. --

Colóquio: Política e Transferência na Escola.

Coordenação: Luis Fernando Palacio e Maria Helena Martinho

Luciano Elia - Ele começa questionando as incidências da análise nos modos de enlace entre os analistas, ou seja, nos modos como os analistas se associam. Temos impressão que, em relação a política, muitos analistas parecem estar precisando começar sua análise e não ter terminado. Os seminários de Lacan correspondem a seu próprio percurso de análise. O campo lacaniano é o campo do gozo. O falo tomou o lugar do Nome-do-Pai no segundo classicismo lacaniano (Milner). O Nome-do-Pai declina e vai sendo substituído pelo falo. A histérica supera o mestre porque sabe da castração que este esconde sob a barra. Os analistas lacanianos estariam conseguindo ocupar o lugar de semblante de objeto a? Estará a histérica encontrando um mestre no lugar do analista? Se a análise realiza operações no campo do gozo, como não pode realizá-las no campo da política? O passe parece não ter conseguido realizar sua tese, a saber, a de pôr a prova o fim de análise.

Viviana Gomez - Não encorajar o Outro. A forma de transmissão privilegiada por Lacan foram os cartéis. Não há relação sexual - há apenas laço e identificação com a massa. Viviana cita Colette Soler, que fala do passe como passar para um tempo de melhor vida. É um luto programado que descobre o universal da castração. O analista deve acompanhar o luto do analisante até o fim. A formação do analista em escola se dá através do cartel e passe. O cartel orienta a transferência de trabalho e inclui o problema da formação do analista.

Bárbara Guatimosim - O desejo do analista fica de frente com o impossível diante de uma demanda de análise. A batalha ou guerra do analista é fazer com que se dê o dizer, ou melhor, o bem-dizer. O tempo lógico remete a função da pressa - a urgência de concluir. A conclusão é singular, pois a psicanálie busca a discriminação do sujeito, ao contrário de muitos slogans atuais que recriminam a discriminação. O amor do analista é o amor pela diferença absoluta.

Ana Laura Prates - Escola - transferência - transferência de trabalho. Fim de análise não consiste em estar liberado de seus sintomas, mas saber porque se está amarrado neles. A transferência não é liquidada, mas resolvida. Bernard Nominé diz que a escola não se baseia na transferência porque ela é uma condição necessária, mas é resistência ao mesmo tempo. No seminário 8, Lacan fala daquilo que está para além do amor, o agalma ou objeto do desejo. O líder é uma ilusão para manter a massa unida. Ilusão do amor do líder sendo igual por todos os membros da massa. O ideal no lugar de objeto a é o mesmo engodo nas massas e na transferência. O modelo freudiano de fim de análise não supera o pai (rochedo da castração). Lacan vai mais além. A transferência de trabalho torna possível a experiência de criação.

Aline de Alvarenga Coelho

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